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A importância de um trabalho postural com crianças

Você bem sabe que tenho preparado uma série especial com excelentes profissionais enfatizando que CRIANÇA NÃO É MINI ADULTO. Este texto foi escrito com base na nossa conversa no Instagram, no dia 09/08/21, em que falamos sobre a importância de um trabalho postural com crianças.

Família foto criado por teksomolika – br.freepik.com

Uma frase da Patrícia (minha convidada nesse dia) que eu adoro é: “uma boa informação trata a família inteira”. Ela se refere àquela informação postural que muda os hábitos do paciente e de quem convive com ele.

A boa informação vai além da prevenção, ela trata. Informe sempre, explique com a maior riqueza de detalhes possível. A boa informação pode livrar uma família de se entregar a um trabalho ruim porque, com boas informações, a família saberá julgar se o tratamento é bom ou ruim, e ajudará a família a escolher bem.

Em se tratando de crianças, uma vez que estamos numa série intitulada “CRIANÇA NÃO É MINI ADULTO”, vamos começar dizendo que, quando levamos as crianças ao médico, levamos logo ao pediatra; adolescentes ao hebiatra; se for ao dentista, odontopediatra. Por que na fisioterapia não temos um profissional dedicado as questões das crianças e adolescentes? 

Sabemos também que, na Fisioterapia, a pediatria é vista (e muito bem vista por sinal) como Neurologia ou Cardiorrespiratória, mas temos visto um crescente público com muitas questões que transcendem as neurológicas e cardiorrespiratórias. Estamos falando aqui da Ortopedia e da Reumatologia. Destas questões, quero começar falando das questões posturais.

Para isso, convidei a Fisioterapeuta Patrícia Ferreira Guedes, especialista pela UNIFESP em ortopedia/aparelho locomotor no esporte e mestre pela USP na área de postura e movimento. Docente no curso de Fisioterapia, nunca parou de estudar e aplicar o que estuda em postura em seus pacientes. Além disso, tem dois cursos incríveis saindo do forno, tanto para profissionais Fisioterapeutas quanto para o público final (pessoas que gostariam de melhorar sua postura enquanto trabalham sentados ou em pé), e é autora do livro “Manual da Postura Infantil”. Só por parte do currículo você já pode ver a autoridade dela nesse assunto tão complexo que é postura da criança.

Então, a primeira pergunta que fiz a Fisioterapeuta Patrícia foi: por que os fisioterapeutas, em geral, não estão estudando as fases do desenvolvimento infantil depois que a criança tem 7 anos? Afinal, as crianças continuam em desenvolvimento e precisam de atenção a suas peculiaridades (atenção fisioterapeuta, essas perguntas aparecem na live e podem aparecer para você).

Essa foi a pergunta que abriu a nossa conversa, então vamos lá!

 

PERGUNTA 1: minha filha tem mamas grandes e depois que começou a crescer as mamas, ela começou a se fechar, como se fosse um caracol, querendo esconder as mamas.

Patrícia: A primeira pergunta dos pais é, normalmente, sobre a quantidade de tempo que leva essa reabilitação. A resposta do profissional é sempre essa: quanto tempo ela levou para ficar assim?

Impossível precisarmos o tempo, mas é possível descrever o como.

Quão interessada essa criança está em mudar de postura? Essa postura está móvel? Rígida? O quão sensível ou resistente ao toque essa adolescente é? Então, como trabalhar a postura de uma adolescente?

Pergunte sempre quando menstruou, isso te norteará em que fase de maturação ela está. Como se comporta o tecido conjuntivo e a modelação de colágeno muito importa para decidir as técnicas a serem usadas.

O Fisioterapeuta é um facilitador, o agente é a criança/adolescente. Por isso que mostrar aos pais de quem é o corpo e quem sustentará essa nova postura é primordial para que entendam o tempo da reabilitação.

Renata: Então, como a família convence a criança que ela tem que trabalhar a postura?

Patrícia: A família não convence, acho que ninguém convence. O que podemos fazer é informar. Numa avaliação o fisioterapeuta tem a obrigação de BEM informar.

 

PERGUNTA 2: como convencemos os pais a trabalhar a postura dos filhos?

Renata: Da mesma forma: informando. Por isso invisto tanto tempo com mídias sociais como, por exemplo, elaborar esse texto aqui.

Patrícia: A postura terapêutica também manda muito no “convencimento” dos pais. Mais do que convencer, nosso papel é conscientizar. Para isso, novamente, informação de qualidade.

Uma outra questão que também compete ao fisioterapeuta é trabalhar a alta expectativa dos pais. Às vezes, na intenção de ajudar, os pais tendem a cobrar muito o “arruma essa postura”, conserte seus ombros, uma ansiedade que é passada para a criança de forma ruim e imperativa. Eu já fui cobrada por várias mães de não cobrar o “arruma a postura” da criança.

Veja bem, colocar limites durante a terapia, mostrar o que pretende ganhar e o que já ganhou também faz parte dessa conquista diária.

Renata: A mãe trouxe a criança, ou seja, ela já está empenhada nessa melhora, cabe a nós apenas ajustar as expectativas. Mostrar a essa família que alguns comentários ajudam e outros atrapalham faz parte do nosso trabalho, mas nunca exponha essa mãe negativamente à criança. Chame ela no particular (aqui, quando falo mãe, me entenda, pode ser o pai, a avó, a babá, no geral, quem traz).

Como mãe eu gosto muito de dizer que não é tão simples mudar o hábito da casa. Então, cuidado ao propor mudanças. Ouça a família antes!

Patrícia: Criança gosta de movimento. Importante dizer isso aos pais. Eles não ficam “parados” na mesma postura, nunca. Essa é uma das grandes diferenças no tratamento postural de crianças e adolescentes. Técnicas estáticas costumam não dar bons resultados em crianças e adolescentes.

 

PERGUNTA 3: o que é então uma boa postura? Como usar cada esporte a favor da postura? Um esporte pode influenciar positivamente na postura? Pode influenciar negativamente? O que é um padrão rígido de postura?

Patrícia: Cada esporte tem sua peculiaridade, sua postura, seu equilíbrio postural dinâmico, mas as mães perguntam “por que eu coloquei meu filho no esporte x e ele não melhorou a postura?”

Renata: Existe isso de os esportes não “agregarem” na postura?

Patrícia: Se eu quero melhorar meu gesto esportivo lá no remo, preciso ver o que está fixado ou fraco para aquele determinado esporte. Da mesma forma, se temos uma criança com questões importantes posturais, nenhum esporte por si só dará conta disso.

Veja bem, não estamos nem de longe falando mal de nenhum esporte. Nós duas temos especialização nessa área, e isso também não quer dizer que a criança não tenha de fazer esporte, ela tem de fazer sim. Mas é responsabilidade do Fisioterapeuta e do Educador Físico se a particularidade do esporte aumenta ou melhora a fragilidade postural individual dessa criança ou adolescente.

Fragilidade significa que essa criança já não está dando conta daquela postura. Imagina, então, se coloco mais uma carga muscular/articular sobre essa “fragilidade”? Se ela já tem uma assimetria e esse determinado esporte aumenta essa assimetria? Teremos problemas. Isso não quer dizer que a criança não poderá realizar esse esporte, isso apenas significa que essa criança terá de trabalhar isso concomitante a essa prática esportiva, e quem realiza esse trabalho é o Fisioterapeuta.

Esse é o momento em que trabalhamos muito e em paralelo ao Educador Físico. Nossa finalidade nesse momento é melhor o desempenho no esporte e trabalhar o corpo em desenvolvimento dessa criança/adolescente.  Às vezes o gesto esportivo pode até fixar um padrão postural, por isso a necessidade do trabalho em conjunto.

Renata: Por exemplo, um praticante de natação que já tem uma fixação postural ou uma assimetria postural, a prática do tênis que é bem assimétrico, um futebol que ora é assimétrico, ora é cruzado.

Patrícia: O que sempre salva é o raciocínio clinico e a biomecânica. Estes dois precisam nos acompanhar sempre. Isso tudo associado a qual fase do desenvolvimento essa criança está.

Renata: O que é então uma boa postura?

Patrícia: Uma boa postura leva em conta a simetria não de forma rígida, mas dinâmica, a agilidade motora, força, flexibilidade, autonomia motora. A boa postura vai exigir que o corpo consiga andar, pular, rastejar, de forma “plena”, mas, principalmente, sem desgaste articular ou sem desgaste desnecessário de energia.

Seria irresponsabilidade (apesar de uma corrente grande de profissionais adotarem essa fala) dizer que tudo pode, precisamos apenas nos lembrar que apesar de termos muitas técnicas novas sempre aparecendo, Fisiologia, Anatomia e Biomecânica não mudam.

 

PERGUNTA 4: vamos falar sobre o estirão do crescimento?

Patrícia: O que mais incomoda pai e mãe é uma cifose, seja ela estrutural ou postural. Atitudes como assimetria de quadril, rigidez de pé, valgo dinâmico não formam coisas preocupantes e tratáveis.  Quando pensamos na palavra postura, já nos ajeitamos endireitando a cifose torácica.

O tecido conjuntivo está amadurecendo. Impregnação hormonal nos tecidos, GH, estrógeno, testosterona, esse é o momento de aproveitar para tratar para melhorar essas fixações, em meninas logo após a menarca.

Muito cuidado em colocar as técnicas que são as grandes mestras para a postura para aplicar nas crianças. Não é que não pode, mas é o tempo de uso e de fixação postural. Se você tem dúvida, use técnicas mais dinâmicas. Não temos regras. Cada caso tem um raciocínio específico.

Ao eleger um tratamento, importante ressaltar qual o principal benefício que a criança terá com a determinada técnica e também não começar do mais difícil, principalmente para não haver a desistência do tratamento.

Renata: Muito cuidado também com as cargas. Criança tem a físe de crescimento aberta. Cuidado com onde, como e para que se coloca carga no exercício.

Outra coisa, nem todo mundo se dá bem com todas as técnicas, por melhor que seja a técnica.

Não meça a competência de um Fisioterapeuta para criança pelas técnicas que ele tem no currículo, mas se sabe realmente tratar de criança. Como você sabe se ele sabe tratar de criança? Se sabe as particularidades como as diferenças anatômicas e fisiológicas de cada fase do crescimento.  A técnica X ou Y precisam apenas acrescentar, e não ditar o que e o como.

Patrícia: Nem todas as questões que parecem posturais são posturais. Às vezes é só uma questão de coordenação motora. E também, respeite o cansaço da criança.

Outra coisa, nem sempre para tratar criança tem de fazer “gracinhas e micagens”. Não é só a micagem. Pense sempre nas particularidades e proporções das crianças.

Lembre-se que postura é tridimensional. Ela é deitada, sentada, em pé, em movimento. Postura não é o que, mas sim, o como. Como as atividades são realizadas? Às vezes a criança não tem alteração estática, mas tem dinâmica.

Renata: A postura está relacionada a propriocepção corporal?

Patrícia: Tem vários profissionais dizendo que o mal jeito de sentar e se portar não interferem na postura. Mas enfim, essa não é a nossa opinião. A má postura TAMBÉM está relacionada a propriocepção, porque o crescimento altera a interocepção corporal durante o crescimento.

A criança precisa experimentar diferentes esportes, mas é interessante levar em conta em que fase a criança está, e normalmente isso está relacionada ao interesse dela por cada esporte. Algumas fases mais próprias para saltos, outras para velocidade, outras para estratégia. Essa avaliação é importante para saber como a criança estará na prática do esporte.

É importante acrescentar na agenda os dias de movimento.

Fisioterapeuta, nunca aplique técnica de adulto e aplique igual a criança. Avalie dosagem, anatomia, comando verbal, e em que fase do desenvolvimento que a criança está. Pai, se algo chamou a sua atenção, olhe e marque uma avaliação, mesmo que pareça boba à sua percepção.

Quanto mais cedo tratar, melhor.

Renata: Procure sempre um profissional da sua confiança. Desconfie de mágicas e falsas expectativas, e lembre-se: CRIANÇA NÃO É MINI ADULTO.

 

Patrícia Ferreira Guedes

Fisioterapeuta CREFITO 3 – 27749-F

No livro Manual da postura infantil da Fisioterapeuta Patrícia Ferreira Guedes ela trata muito bem essa questão de prevenção, consciência, hábitos posturais de forma bem didática.

 

Renata Pereira Soares de Oliveira

Fisioterapeuta CRIFITO 3 – 33415-F

 

Leia também sobre: OSTEOCONDRITES (o que são, como reconhecer e tratar)

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